sábado, 2 de março de 2013

"Tem um dinheiro aí?"

Hoje de manhã, enquanto eu saía da padaria, um homem me abordou e pediu dinheiro. Ele disse que era para pegar o ônibus para Toledo. Enquanto estava entrando no carro, eu disse "não". Aí ele insistiu, perguntou se eu não daria nem dez centavos. Falei "não vou dar". Ele ficou parado ao lado do carro, pareceu não acreditar no que eu havia dito. Então, olhei nos olhos dele, e ele saiu de perto. Ao sair com o carro, olhei no retrovisor. Ele abanou os braços, batendo-os de leve contra as pernas, em sinal de indignação.

Decidi não dar dinheiro a ele porque a história, no momento, não me convenceu. Já fui abordado por inúmeras pessoas, em diversos locais diferentes, que pediram dinheiro com essa mesma justificativa. Ele estava vestido normalmente, não era um mendigo. Simplesmente não pareceu que aquilo fosse verdade na hora.

Um fato com certeza pesou. Eu havia deixado minha filha em casa para ir na padaria. Ela estava acordada e vendo televisão. Disse que precisava ir, para que ela pudesse tomar o café da manhã. Ela concordou. Levei a chave. Eu só queria ir e voltar o mais rápido possível. Se eu fosse assaltado, ela estaria em perigo também.

Pensei sobre o que aconteceu no caminho e depois em casa. Fiquei com várias dúvidas.

Será que temos que dar dinheiro? Independente da necessidade do pedinte, ao sermos abordados, estamos em situação de débito? Sou uma pessoa ruim porque recusei? Ou porque simplesmente duvidei da palavra dele?

Confesso que quando sou abordado dessa forma, ao sair ou ao chegar no carro, já fico com receios. Ouço diversos casos todo dia de pessoas que foram abordadas e, ao demonstrarem boa intenção, descobriram a má intenção de quem abordou. Até a polícia dá inúmeras dicas de como se proteger. Ela informa que as abordagens enquanto a pessoa adentra ao carro representam grande parte dos crimes nas cidades. Talvez, parte do que senti, e da forma como reagi, foi por necessidade de defesa. Mesmo que pequena.

Outro pensamento interessante. Eu deveria ter mentido? Poderia dizer, no momento, que não tinha dinheiro. Apesar que o tilintar das moedinhas no bolso poderia me denunciar. Poderia ter dito que paguei no cartão. Assim, não haveria dinheiro para dar, nem o aparente "compromisso".

Eu não minto. Dando o exemplo, ensino minha filha a não mentir. Não acho que a mentira seja necessária, embora muitos afirmem que seja. Se não posso dizer a verdade, simplesmente não digo nada. Caso a informação afete não somente a mim, falo que não posso informar. No caso da abordagem, falei a verdade. Várias pessoas inventariam histórias. Ou até dariam o dinheiro, de forma a livrar-se logo do "inconveniente".

Por outro lado, penso que eu deveria ter sido mais humano. A história poderia ser verdade. O olhar dele pareceu mesclar sentimentos de indignação e de decepção. Mas só fui perceber isso no caminho de volta.

Tento me imaginar em situação semelhante. É uma humilhação, para uma pessoa que preza pelo trabalho, ter que pedir. Não seria confortável, pelo menos para mim.

Depois de pensar muito, arrependi-me do que fiz. Várias dúvidas permaneceram na minha cabeça. Naquele momento, eu poderia tentar questioná-lo, de maneira a eliminar as dúvidas. Poderia ter perguntado, de forma ríspida: "onde você mora em Toledo?", ou "o que veio fazer aqui num sábado de manhã?", "em qual empresa veio fazer a entrevista?". Se a história dele ficasse um pouco mais verídica, acho que eu teria dado o dinheiro.

Ou talvez não. Confesso que não sei.

Também não acho que devo internalizar essa situação e tentar agir dessa maneira da próxima vez que eu for abordado. Talvez alguns "circuitos" do meu cérebro estavam alertas. É possível que meu inconsciente "captou" alguma coisa, emitiu um alerta, e no "balanço contábil" da avaliação entre a verdade e a mentira - com peso importante por ter deixado minha filha em casa -, pareceu-me a melhor atitude a tomar no momento.

Decidi escrever sobre o assunto porque, apesar de parecer banal, acontece diariamente com todos nós. Em todas as cidades existem pedintes, flanelinhas, "malucos que falam sozinhos" (esses merecem um texto à parte), assim como pessoas com intenções diversas, como viciados, assaltantes e outros. São personagens das cidades, assim como nós. Se queremos viver em sociedade, viveremos com essas pessoas.

Mesmo que algumas pessoas relutem, há pouco o que fazer. Não cabe dizer que o governo não está fazendo seu papel. Creio que existam pessoas com problemas em todos os países, inclusive os mais desenvolvidos. Os governos trabalham para diminuir os problemas das pessoas. Mas sem o auxílio de toda a sociedade, é um trabalho perdido.

Tudo isso, ao final, foi positivo para mim. O que aconteceu me fez refletir, e isso é sempre bom. Esse fato me ensinou que tenho que ter a mente limpa de preconceitos, avaliar bem a situação, tentar obter o máximo de informação que for possível no momento, confiar que meu "CPU" faça uma salada com tudo isso e tomar a decisão que aparente seja a correta. Confesso que falhei em tentar obter o máximo de informações. Mas me orgulho de não ter mentido.

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